Desde a mais tenra infância, fomos ensinados a refrear certos sentimentos. Era feio ter inveja, raiva, ódio, e por aí vai. Mas será mesmo? E quem é a santa que só tem no coração bondades e caridades? Querendo ou não, os sentimentos – bons e maus – surgem, mas nos ensinaram que os piores devem ser afastados em nome já esqueci de quê. E como fingir que eles não existem, como ignorar o que está dentro do peito? Que tal tentar conviver com eles reconhecendo que somos apenas pessoas normais, para o mal e para o bem?
Digamos que sua grande amiga seja maravilhosa, tenha 10 centímetros a mais do que você e 10 quilos a menos. Além disso, é charmosa, inteligente, simpática e generosa – o que, aliás, não é nenhuma vantagem, com tantas qualidades – e consegue seduzir, sem fazer o menor esforço, homens, mulheres e crianças. Que raiva, que inveja. Fazer o quê? Em primeiro lugar, reconhecer o que está sentindo e as razões desses sentimentos. Não será preciso ir longe a ponto de dizer: “Eu te odeio porque você é mais bonita do que eu”. Mas, quando estiver sozinha, pode ficar com toda a raiva do mundo e odiá-la com todas as forças do seu coração – para aliviar o peito e não ter um infarto; isso ajuda a passar. E, quando adorar uma pessoa, deve também ir fundo e dizer que gosta sem nenhum pudor, pois gostar e fingir indiferença não tem a menor graça.
Já reparou como, para certas pessoas, é difícil elogiar? Quem escolher viver honestamente todos os seus sentimentos ai perder alguns amigos, mas, em compensação, os que ficarem vão ser para sempre. De que adianta o telefone tocar o dia inteiro se é preciso fingir que é indiferente para ser querida, para ter com quem ir à praia?
Quando tiver vontade de torcer o pescoço de seu filho adorado – porque isso às vezes acontece –, permita-se reconhecer e, se puder, diga a alguém – uma amiga, o padre ou o analista – quanto gostaria, naquele momento, de esganar a carne da sua carne e o sangue do seu sangue. Depois que a raiva passar, diga a ele, que vai achar muita graça. Assim, você estará abrindo para ele a possibilidade de lhe dizer um dia a mesma coisa, o que vai ser maravilhoso para a amizade de vocês. Porque entre mãe e filho, além do amor, se tiver também amizade, é a melhor coisa do mundo. E convém que ele saiba que, quanto mais próximas as pessoas, mais ocasiões e razões temos para amá-las ou odiá-las, e que isso é normal (e não deve trazer culpas).
Como é bom falar mal de uma pessoa, dizer com carinho que ela não vale nada e terminar confessando que é exatamente por isso que é louca por ela. Quando se ouve uma declaração de amizade dessas, nunca mais se esquece, e ser especial para alguém é tudo que se quer.
E mais: sofrer, chorar, rir, abraçar, beijar, passar noites em claro, de tanta felicidade ou de tanto sofrimento, acordar um dia achando que o mundo é todo seu e no outro não conseguir nem se levantar da cama de tanta tristeza sem nenhum motivo – é isso que diferencia uma vida plena e rica de outra morna e medíocre.
Dinheiro se economiza, mas emoções, sejam de felicidade ou de tristeza, de amor ou de raiva, nunca. Vá sempre fundo – a não ser que você esteja na vida a passeio, o que é uma escolha; uma triste escolha, aliás. Porque todos os sentimentos são nobres – inclusive os piores.
Danuza Leão é cronista, autora de vários livros, entre os quais Na Sala com Danuza 2 (ARX) e Quase Tudo (Cia. das Letras)
Foto Eduardo Pozella
Foto Eduardo Pozella
Nossa vida é cheia de sentimentos diferentes neh, na mesma hora que estamos felizes da vida nos deparamos com algo que nos deixa pra baixo... mas é isso aí, adorei o texto!
ResponderExcluirO que seria da vida, das pessoas se não fosse essa explosão de sentimentos, humores.... seria tudo muito monótono!
Mto interessante amiga!
ResponderExcluirÉ bem difícil lidar com eles mesmo, acho que o segredo é dosar, embora nem sempre saibamos...